segunda-feira, novembro 27, 2006
O "NINJA"
Depois de resistir por tantos anos ao forçoso êxodo pra cidade grande, cada dia mais inexorável, Cleidinaldo, cujo nome era a junção do da sua mãe, D. Cleide, com o do seu pai, Edinaldo, aos dezessete anos viu chegar a sua vez de se mandar pra São Paulo, levado por um tio que lá se encontrava estabelecido e que lhe arranjara um emprego numa fábrica de papel. Ele bem que tentou dissuadir os pais da idéia, mas não teve jeito. Com a malvada seca assolando suas terras, não tinha alternativa alguma a não ser tentar outra forma de ajudar nas despesas da numerosa família.
Todo mundo "caiu de pau" em cima dele. "Como é que pode? Você se nega a ajudar o seu velho pai, que tanto sofreu trabalhando pesado na roça pra sustentar você e seus irmãos? "- diziam vizinhos e parentes, inconformados com a sua relutância em partir. Sim, porque na sua cidadezinha era assim: Completou 14 anos e pesou mais de 38 quilos ... Ao trabalho, que pai de família não é pra dar moleza a vadio, não senhor!
Não era preguiça ou medo de não se adaptar, ou, ainda, de não suportar a saudade do seu torrão natal que o prendia àquele lugar. A situação era bem mais apavorante, até porque o coitado nem tinha com quem explicitar o problema que o corroía: Cleidinaldo era um viciado em sexo! Não podia nem imaginar como seria passar um dia sequer sem "deitar a madeira", conforme costumava se referir às artimanhas do amor e de tantos prazeres recém descobertos.
Convencido de que não poderia sair dessa, teve que capitular e deixar que lhe comprassem a passagem, mas aí entrou numa fase de horrores e suores noturnos que o faziam ver chegar a luz do dia sem, sequer, pregar olhos ... "Como vou conseguir passar três dias num ônibus sem uma mulher?" - pensava. "Quem sabe encontro alguma alma caridosa que me faça esse carinho, silenciosamente, quando as luzes se apagarem e todos estiverem dormindo?" - devaneava... E assim chegou o triste dia; a viagem transcorreu sem qualquer agradável surpresa, assim como os dias posteriores e as noites também, pro desespero total do dependente sexual.
Já na fábrica, assim que foi apresentado aos primeiros colegas de trabalho e estes lhe deram alguma brecha, cuidou logo de lhes falar sobre o problema que lhe atormentava tanto, implorando uma ajuda urgentemente, pois não podia mais nem ver saia de abajur, tamanha era a secura em que se encontrava.
Ficou surpreso com a receptividade e compreensão dos novos amigos quanto ao seu S.O.S ... Muito solícitos, cuidaram em tranquilizá-lo dizendo que não se preocupasse, pois conheciam todas as meninas da fábrica (inclusive as mais dadinhas) e iriam cuidar dele. "Se guenta aí, meu, que a gente vai quebrar teu galho numa boa. Isso pra nós é bronca safada" - disseram.
Cleidinaldo ficou aliviado (em termos, porque não podia mais se aguentar) e, desde então, passou a cobrar-lhes diariamente o cumprimento da promessa ... E nada! Muita conversa e pouca atitude, pro seu gosto..."Home que é home cumpre o que fala"... Já tô já me arretando! - dizia-lhes, ameaçador.
O que Cleidinaldo não sabia era que caíra em mãos erradas; Seus novos colegas faziam parte de um grupo racista que pregava o ódio aos nordestinos e a todas as outras "sub-raças" ... Sacumé, né? ... "Narciso acha feio o que não é espelho", segundo Caetano Veloso e essas coisas são irrefreáveis.
Os novos "amigos" não viam a hora de pôr em prática o seu maquiavélico plano: Atrair o "paraíba" prum lugar ermo e lá dar-lhe uma coça daquelas. Propositalmente, deixaram passar algumas semanas até que o coitado já estivesse embotando o raciocínio de tanto tesão, pra lhe dar a "boa nova". Antes, cuidaram de procurar um sujeito que costumava fazer servicinhos sujos pra eles, cujo apelido era "O Ninja". Tratava-se de um skin-head lutador de jiu-jitsu, vaidoso dos seus bíceps e tríceps bem definidos e da sua bravura, temida por todos os que lhe conheciam. Por qualquer dez reais aceitava aprontar com alguém e quando soube que sua vítima seria um nordestino e que o grupo lhe pagaria gordos duzentos reais pelo serviço, quase foi ao orgasmo de tanto deleite... "Já tô com ódio desse cara, meu!" - exclamou, ao ser informado de que o tal "paraíba", além da sua comprometedora origem, ainda tinha ousado dedurar os amigos ao chefe (mentirinha elaborada pra acirrar os ânimos do "Ninja" e que surtiu um efeito extraordinário)... Vou matá-lo! - disse, cheio de bravatas.
Inocente, puro e besta, Cleidinaldo sonhava com o dia de "lavar a égua" ... Já estava amarelo que só um peido, olheiras roxas, andar trôpego e aspecto de morto-vivo de tanto esperar aquele momento. Nem a recorrência à auto-ajuda o satisfazia completamente, pois dormia no sofá da casinha dos tios - sala, quarto e banheiro - e morria de vergonha de ser pego no "flagra", o que, por si só, já embotava a sua imaginação, elemento essencial para a plenitude desse ... self service, digamos assim.
Eis que chega o grande dia! Os seus solícitos amigos o procuram e lhe comunicam que à noitinha, quando saírem do expediente, o levarão, enfim, pra o tão esperado "consumatum est". Fingindo uma chateação e um constrangimento que estavam longe de sentir, mal contendo o sorriso entre dentes, revelam, por fim, o seu insucesso em conseguir uma mulher pra atender aquela necessidade ... "Paraíba, desculpa, mas só foi possível descolar um bichinha ... As meninas que a gente contatou não gostam de nordestinos e aí não deu outra, meu! Mas a biba é muito legal e sempre nos acode também".
Cleidinaldo, decepcionado, quase enjeitava a parada. Mas a coisa era emergente demais pra ser regateada e ele, vencendo o desafio, aceitou a proposta, mesmo considerando-a escandalosa. "Ai, meu Deus ... se pai sabe disso eu tô lascado! Nunca me ví numa situação dessas, mas vício é vício e eu não aguento mais esperar. Fazer o quê?" - pensou. Meio cabreiro, dirigiu-se ao galpão abandonado aonde se daria o encontro, acompanhado do grupo.
Chegando no local, os "amigos"certificaram-se de que o "Ninja" já os esperava lá dentro, no escuro, sorrateiro e cheio de energia... "Ninja, não precisa matar o cara não, tá? Assim vai complicar a gente. Basta dar-lhe uma surra até o sujeito ficar molinho, no chão" - sussurraram, enquanto Cleidinaldo esperava, ansioso, no lado de fora, aguardando a confirmação de que a "boneca" já se encontrava lá.
Os "amigos", tendo lhe tranquilizado de que tudo estava perfeito, empurraram-no pra dentro do galpão, trancaram a porta por fora e ficaram ali, se matando de rir enquanto ouviam os gritos, socos e pontapés que ecoavam até os seus maldosos ouvidos.
Minutos depois fez-se um silêncio sepulcral ... Até que ouviram sons de arranhões e de gemidos pelo lado de dentro da porta e, temerosos de que uma fatalidade tivesse acontecido, acorreram pra abrí-la. Surge, então, Cleidinaldo! Todo rasgado, machucado, sangrando pelo nariz e pela boca ... Um trapo!
O grupo, mal contendo o sorriso que ameaçava explodir de dentro de si, fingem surpresa e horror, exclamando:
- Pô, Paraíba! O que foi que aconteceu, meu?
E Cleidinaldo, todo fudido mas com uma expressão bem mais aliviada, responde, enquanto fecha a braguilha:
- Né foda? O viado não queria dar não, ó! Num dá o quê? E eu tô bestando, é?
Todo mundo "caiu de pau" em cima dele. "Como é que pode? Você se nega a ajudar o seu velho pai, que tanto sofreu trabalhando pesado na roça pra sustentar você e seus irmãos? "- diziam vizinhos e parentes, inconformados com a sua relutância em partir. Sim, porque na sua cidadezinha era assim: Completou 14 anos e pesou mais de 38 quilos ... Ao trabalho, que pai de família não é pra dar moleza a vadio, não senhor!
Não era preguiça ou medo de não se adaptar, ou, ainda, de não suportar a saudade do seu torrão natal que o prendia àquele lugar. A situação era bem mais apavorante, até porque o coitado nem tinha com quem explicitar o problema que o corroía: Cleidinaldo era um viciado em sexo! Não podia nem imaginar como seria passar um dia sequer sem "deitar a madeira", conforme costumava se referir às artimanhas do amor e de tantos prazeres recém descobertos.
Convencido de que não poderia sair dessa, teve que capitular e deixar que lhe comprassem a passagem, mas aí entrou numa fase de horrores e suores noturnos que o faziam ver chegar a luz do dia sem, sequer, pregar olhos ... "Como vou conseguir passar três dias num ônibus sem uma mulher?" - pensava. "Quem sabe encontro alguma alma caridosa que me faça esse carinho, silenciosamente, quando as luzes se apagarem e todos estiverem dormindo?" - devaneava... E assim chegou o triste dia; a viagem transcorreu sem qualquer agradável surpresa, assim como os dias posteriores e as noites também, pro desespero total do dependente sexual.
Já na fábrica, assim que foi apresentado aos primeiros colegas de trabalho e estes lhe deram alguma brecha, cuidou logo de lhes falar sobre o problema que lhe atormentava tanto, implorando uma ajuda urgentemente, pois não podia mais nem ver saia de abajur, tamanha era a secura em que se encontrava.
Ficou surpreso com a receptividade e compreensão dos novos amigos quanto ao seu S.O.S ... Muito solícitos, cuidaram em tranquilizá-lo dizendo que não se preocupasse, pois conheciam todas as meninas da fábrica (inclusive as mais dadinhas) e iriam cuidar dele. "Se guenta aí, meu, que a gente vai quebrar teu galho numa boa. Isso pra nós é bronca safada" - disseram.
Cleidinaldo ficou aliviado (em termos, porque não podia mais se aguentar) e, desde então, passou a cobrar-lhes diariamente o cumprimento da promessa ... E nada! Muita conversa e pouca atitude, pro seu gosto..."Home que é home cumpre o que fala"... Já tô já me arretando! - dizia-lhes, ameaçador.
O que Cleidinaldo não sabia era que caíra em mãos erradas; Seus novos colegas faziam parte de um grupo racista que pregava o ódio aos nordestinos e a todas as outras "sub-raças" ... Sacumé, né? ... "Narciso acha feio o que não é espelho", segundo Caetano Veloso e essas coisas são irrefreáveis.
Os novos "amigos" não viam a hora de pôr em prática o seu maquiavélico plano: Atrair o "paraíba" prum lugar ermo e lá dar-lhe uma coça daquelas. Propositalmente, deixaram passar algumas semanas até que o coitado já estivesse embotando o raciocínio de tanto tesão, pra lhe dar a "boa nova". Antes, cuidaram de procurar um sujeito que costumava fazer servicinhos sujos pra eles, cujo apelido era "O Ninja". Tratava-se de um skin-head lutador de jiu-jitsu, vaidoso dos seus bíceps e tríceps bem definidos e da sua bravura, temida por todos os que lhe conheciam. Por qualquer dez reais aceitava aprontar com alguém e quando soube que sua vítima seria um nordestino e que o grupo lhe pagaria gordos duzentos reais pelo serviço, quase foi ao orgasmo de tanto deleite... "Já tô com ódio desse cara, meu!" - exclamou, ao ser informado de que o tal "paraíba", além da sua comprometedora origem, ainda tinha ousado dedurar os amigos ao chefe (mentirinha elaborada pra acirrar os ânimos do "Ninja" e que surtiu um efeito extraordinário)... Vou matá-lo! - disse, cheio de bravatas.
Inocente, puro e besta, Cleidinaldo sonhava com o dia de "lavar a égua" ... Já estava amarelo que só um peido, olheiras roxas, andar trôpego e aspecto de morto-vivo de tanto esperar aquele momento. Nem a recorrência à auto-ajuda o satisfazia completamente, pois dormia no sofá da casinha dos tios - sala, quarto e banheiro - e morria de vergonha de ser pego no "flagra", o que, por si só, já embotava a sua imaginação, elemento essencial para a plenitude desse ... self service, digamos assim.
Eis que chega o grande dia! Os seus solícitos amigos o procuram e lhe comunicam que à noitinha, quando saírem do expediente, o levarão, enfim, pra o tão esperado "consumatum est". Fingindo uma chateação e um constrangimento que estavam longe de sentir, mal contendo o sorriso entre dentes, revelam, por fim, o seu insucesso em conseguir uma mulher pra atender aquela necessidade ... "Paraíba, desculpa, mas só foi possível descolar um bichinha ... As meninas que a gente contatou não gostam de nordestinos e aí não deu outra, meu! Mas a biba é muito legal e sempre nos acode também".
Cleidinaldo, decepcionado, quase enjeitava a parada. Mas a coisa era emergente demais pra ser regateada e ele, vencendo o desafio, aceitou a proposta, mesmo considerando-a escandalosa. "Ai, meu Deus ... se pai sabe disso eu tô lascado! Nunca me ví numa situação dessas, mas vício é vício e eu não aguento mais esperar. Fazer o quê?" - pensou. Meio cabreiro, dirigiu-se ao galpão abandonado aonde se daria o encontro, acompanhado do grupo.
Chegando no local, os "amigos"certificaram-se de que o "Ninja" já os esperava lá dentro, no escuro, sorrateiro e cheio de energia... "Ninja, não precisa matar o cara não, tá? Assim vai complicar a gente. Basta dar-lhe uma surra até o sujeito ficar molinho, no chão" - sussurraram, enquanto Cleidinaldo esperava, ansioso, no lado de fora, aguardando a confirmação de que a "boneca" já se encontrava lá.
Os "amigos", tendo lhe tranquilizado de que tudo estava perfeito, empurraram-no pra dentro do galpão, trancaram a porta por fora e ficaram ali, se matando de rir enquanto ouviam os gritos, socos e pontapés que ecoavam até os seus maldosos ouvidos.
Minutos depois fez-se um silêncio sepulcral ... Até que ouviram sons de arranhões e de gemidos pelo lado de dentro da porta e, temerosos de que uma fatalidade tivesse acontecido, acorreram pra abrí-la. Surge, então, Cleidinaldo! Todo rasgado, machucado, sangrando pelo nariz e pela boca ... Um trapo!
O grupo, mal contendo o sorriso que ameaçava explodir de dentro de si, fingem surpresa e horror, exclamando:
- Pô, Paraíba! O que foi que aconteceu, meu?
E Cleidinaldo, todo fudido mas com uma expressão bem mais aliviada, responde, enquanto fecha a braguilha:
- Né foda? O viado não queria dar não, ó! Num dá o quê? E eu tô bestando, é?
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