UM CHEQUE MUITO ESPECIAL

ESSE "CAUSO" ACONTECEU NUMA CIDADEZINHA DO INTERIOR AQUI DE PERNAMBUCO E ME FOI CONTADO PELO PRÓPRIO PROTAGONISTA, MATUTO ASSUMIDO, DAQUELES QUE JAMAIS NEGOU SUAS ORIGENS, MUITO PELO CONTRÁRIO. SEMPRE FEZ QUESTÃO DE CONSERVAR O LINGUAJAR E OS COSTUMES PRÓPRIOS DA GENTE DA SUA INFÂNCIA, EMBORA JÁ RESIDA NA CAPITAL HÁ DÉCADAS.

BOM DE PROSA, BEM HUMORADO E CRIATIVO COMO ELE SÓ, ESSE CARA É UM HUMORISTA NATO. LEMBRO COM MUITA SAUDADE DOS TEMPOS EM QUE TRABALHÁVAMOS JUNTOS E REUNÍAMOS A TURMA NOS BARES DA VIDA PRA INESQUECÍVEIS NOITADAS, REGADAS A MUITO CHOPP, MÚSICAS, PIADAS E CONSEQUENTES GARGALHADAS, QUE SE ESTENDIAM ATÉ O NASCER DO SOL, ESPECIALMENTE EM ÉPOCAS DE GREVE.

PROMOVIDO A GERENTE DO BANCO, ELE FOI TRANSFERIDO PARA O MUNICÍPIO DE ÁGUAS BELAS, NO AGRESTE DO ESTADO, MAS NOS FINS DE SEMANA ESTAVA SEMPRE CONOSCO, FALANDO DAS SUAS EXPERIÊNCIAS COM A CLIENTELA DE LÁ E NOS CONTOU O SEGUINTE "CAUSO":


HAVIA UM CLIENTE, NA AGÊNCIA, QUE VIVIA ATORMENTANDO-O NA TENTATIVA DE OBTER UM CHEQUE ESPECIAL. SÓ QUE O SUJEITO ERA UM INADIMPLENTE CONVICTO. PASSAVA CHEQUES SEM FUNDOS, TOMAVA EMPRÉSTIMOS PRA COBRÍ-LOS E NÃO HONRAVA OS COMPROMISSOS ASSUMIDOS... ENFIM, ERA O QUE O BANCO CENTRAL DENOMINAVA DE "CONTUMAZ". TODOS OS DIAS, ANTES MESMO DE ABRIR A AGÊNCIA AO PÚBLICO, LÁ ESTAVA ELE, FAZENDO SINAIS PRO GERENTE, ATRAVÉS DO VIDRO DA PORTA: INDICADOR BATENDO NA BOCA, NUM GESTO DE "QUERO FALAR COM VOCÊ", MOVIMENTOS FRENÉTICOS DAS MÃOS CHAMANDO O NOSSO AMIGO PRA LIBERAR A SUA ENTRADA ANTECIPADA NO BANCO ... "UM PENTELHO ENCRAVADO NA EMENDA", COMO DIZIA O PRÓPRIO.

QUANDO INSTADO A SE ESFORÇAR PARA REGULARIZAR A SUA SITUAÇÃO CREDITÍCIA, SEMPRE RESPONDIA: "TÁ VENDO, DOUTOR? O SENHOR NÃO QUER ME DAR UM CHEQUE-AZUL! SE O MEU CHEQUE FOSSE AZUL, TAVA LIVRE DISSO"!
COMO SE UM CRÉDITO ROTATIVO FOSSE A SOLUÇÃO PARA A SUA COMPULSIVA PRODIGALIDADE.

ATÉ QUE UM DIA ELE ABORDOU O MEU AMIGO NUM BAR DA CIDADE E, ENQUANTO BEBERICAVAM JUNTOS, ACHANDO QUE A INTIMIDADE ENTRE ELES JÁ PERMITIA UMA INSTÂNCIA MAIS OUSADA, ATÉ PORQUE SE ENCONTRAVAM NUMA TURMA DE AMIGOS COMUNS, SEM A FORMALIDADE NECESSÁRIA AO RELACIONAMENTO GERENTE-CLIENTE DO ÂMBITO DA AGÊNCIA, ELE MANDOU A SEGUINTE PERGUNTA:

- Ô, DOTÔ ... ME DIGA COMO É QUE EU FAÇO PRO MEU CHEQUE SER AZUL!

E O MEU AMIGO, SEM PESTANEJAR, RESPONDEU:

- SÓ SE O SENHOR PEGAR O SEU TALÃO AMARELO E MERGULHAR TODINHO NUMA BACIA D'ÁGUA COM UM BONECA DE ANIL!

SANTO REMÉDIO! NUNCA MAIS O TAL CLIENTE O IMPORTUNOU COM ISSO.


ESCLAREÇO:
PRA QUEM NÃO SABE, AQUI NO NORDESTE AS NOSSAS MÃES COSTUMAVAM USAR ANIL (EM PÓ OU EM TABLETES) EMBRULHADO EM TROUXINHAS DE RETALHO PARA ALVEJAR AS ROUPAS, QUE ERAM POSTAS, JUNTAS, NUMA BACIA D'ÁGUA. ESSAS TROUXINHAS ERAM CHAMADAS "BONECAS DE ANIL", QUE DEIXAVAM AS ROUPAS BRANCAS ALVÍSSIMAS.